- UMA PRONTA RECUPERAÇÃO DO MERCADO ACIONÁRIO LOCAL
Ao acompanharmos o desempenho do mercado local no ano, nosso comportamento pode acabar sendo tomado pelo sentimento de euforia diante da pronta recuperação do mercado acionário no Brasil. Além do retorno acumulado do Ibovespa no primeiro semestre, de 16%, vemos um alívio na precificação dos ativos em bolsa pela regressão da estimativa do custo de capital, se tomarmos como referência a retração da curva de juros para vencimentos longos. Vemos o reflexo na apreciação dos principais índices mesmo se comparando com demais pares: o EWZ, ETF que replica índice semelhante ao Ibov, em dólar, apreciou 27% no primeiro semestre, enquanto o EEM, de mercados emergentes, valorizou 15%.
O estigma de “pior mercado do mundo” registrado ao fim do ano passado, revezando junto ao México tal posto, parece ter ficado para trás, diante do importante fluxo de capital estrangeiro imigrando ao mercado de capitais do Brasil. O fato de sermos hoje uma das principais referências para especulação por operações de carry trade — tomar dívida em países com níveis de juros retraídos para posteriormente alocar em outros com juros reais elevados, caso atual do Brasil — também estimula fluxo em condições de políticas quase que ordenadas de afrouxamento monetário no mundo, enquanto por aqui ainda sofremos com aumento da Selic, embora com fechamento da curva para vencimentos longos, conforme comentado anteriormente.
Dito isso, a cautela apurada no conteúdo da carta mensal do mês anterior, que condiciona a apreciação do mercado à continuidade da precificação de juros menores além da continuidade de ingresso de capital estrangeiro, tem como contraponto o importante volume dos programas de recompra de ações, ainda em curso. Apesar da regressão à média do prêmio do mercado local, o conteúdo abaixo, apurado pelo Itaú BBA e já comentado anteriormente por aqui, indica que ainda há um volume de quase 70 bi de reais a ser recomprado pelas empresas, e que tivemos um número recorde de programas de recompra abertos em 2024. Deste volume, boa parte está vinculada ao setor financeiro e de utilities.
- BRASIL: O ETERNO PAÍS DO FUTURO, PRESO EM SEU PASSADO
Facta, non verba. Esta expressão latina reflete precisamente um princípio fundamental que todos reconhecemos, mas frequentemente negligenciamos: as ações possuem maior valor que as palavras.
Nesta edição da carta mensal, decidimos apresentar indicadores das instituições brasileiras, abrangendo não apenas o âmbito político, mas também corporativo, com o objetivo de compreender se, no longo prazo, o Brasil tem demonstrado uma melhoria ou deterioração. Esta análise se refletirá em outros indicadores que serão abordados nas cartas dos próximos meses, incluindo qualidade de vida e economia.
O Estudo Nobel e o Determinismo Institucional
Um estudo clássico, laureado com o Prêmio Nobel de Economia em 2024, conseguiu estabelecer uma correlação significativa entre países colonizados, considerando variáveis como nível de urbanização, grau de proteção contra expropriação e a frequência com que os governantes desses países eram mortos.
Os pesquisadores analisaram dados dos últimos 500 anos e descobriram um padrão interessante: países que apresentavam menor desenvolvimento econômico no passado (utilizando a urbanização como proxy de riqueza) tornaram-se mais prósperos atualmente, enquanto aqueles que eram mais ricos na época colonial sofreram um declínio relativo.
Esta pesquisa nos traz a lição de que as instituições dependem necessariamente da história – é impossível dissociar uma dimensão da outra. É possível tentar corrigir o rumo, mas infelizmente a máxima “o passado nos condena” transcende o âmbito filosófico, manifestando-se concretamente no Brasil.
A questão que permanece é: nas últimas décadas, o Brasil tem trabalhado para aprimorar suas instituições ou simplesmente permitido que estruturas deficientes do passado persistam – ou, pior ainda, regridam? Infelizmente creio que você já saiba a resposta.
Estabilidade Política e Ausência de Violência
No indicador de estabilidade política e ausência de violência, observamos que o Brasil apresentava um percentil de 38 em 1996, atingiu um máximo de 57 e atualmente encontra-se em 28, segundo os dados mais recentes de 20241. Isso significa que, neste parâmetro, o país está em situação inferior a 72% dos países mundiais.
Este indicador mensura a probabilidade de um governo ser derrubado por meios violentos ou inconstitucionais. A queda ao longo dos últimos 30 anos sugere que, apesar das promessas, o Estado não consegue entregar à sociedade serviços de qualidade.
Efetividade Governamental
O indicador de efetividade governamental mensura a qualidade dos serviços públicos e a capacidade do governo de executar suas políticas. A trajetória observada demonstra uma deterioração gradual, com o país transitando do percentil 50 para o percentil 32.
O problema fundamental do Brasil não reside na ausência de legislação, mas possivelmente no excesso dela. Nossa constituição é extensa, repleta de promessas e direitos, porém o Estado falha em dispor dos meios necessários para materializar essas garantias, ou sequer reconhece a impossibilidade de tornar todas as promessas exequíveis. Este indicador evidencia o óbvio.
Controle da Corrupção
No indicador de controle da corrupção, o Banco Mundial mensura a percepção sobre o uso do poder público para ganhos privados. Em 1996, o Brasil posicionava-se no percentil 56, atingindo um máximo em 2011 de 63, quando iniciou uma queda praticamente ininterrupta até 2024, chegando ao percentil 34.
Isto significa que o controle da corrupção no Brasil, considerado um dos piores indicadores, posiciona o país em situação inferior a 66% dos países mundiais.
Este tópico será muito mais aprofundado na próxima carta mensal.
Qualidade Regulatória
Avaliando agora a qualidade regulatória, que mede se as regras do governo ajudam ou atrapalham o desenvolvimento do setor privado, podemos observar também, infelizmente, uma queda constante ao longo dos últimos 30 anos. Fomos do percentil 63 para 40. Lamentável.
Esta é uma boa métrica que faz referência ao famoso “Custo Brasil”: burocracia, impostos cada vez mais altos e complexos, e insegurança jurídica. O problema, no fim das contas, não é ter uma regulamentação, mas sim a qualidade dela. A nossa é percebida como ruim e imprevisível. E os eventos recentes, como a tentativa de aumento de impostos, só fortalecem essa percepção.
Estado de Direito
O estado de direito, que mensura a confiança nas regras e instituições, incluindo justiça, contratos e polícia, demonstra que o Brasil permanece abaixo da mediana mundial, transitando do percentil 44 para 41 em 2024. Esta instabilidade reflete a insegurança jurídica e a criminalidade no país. Os contratos não são assegurados e a violência é elevada, resultando em graves consequências econômicas.
Este indicador constitui um dos mais relevantes para investidores de longo prazo. Os investimentos conhecidos como “formação bruta de capital fixo”, tais como fábricas e infraestrutura, exigem um ambiente minimamente previsível. Ninguém investe milhões ou bilhões em projetos que demandam décadas para maturar e gerar retorno, se houver risco significativo de o governo alterar substancialmente as regras, não honrar contratos ou, na pior das hipóteses, confiscar propriedades.
Um estado de direito frágil afugenta o capital que gera crescimento sustentável de longo prazo. E, infelizmente, a formação bruta de capital fixo do Brasil em relação ao PIB tem declinado nas últimas décadas. Coincidência? Certamente não.
A Importância da Confiança Institucional
A confiança constitui um fator de extrema relevância para o funcionamento das instituições. O Banco Mundial divulgou, em 2020, um gráfico correlacionando diversos países quanto ao nível de confiança da população nos seus respectivos governos versus a percepção de corrupção. Neste estudo, quanto menor o valor, menor seria a confiança no governo e maior a percepção de corrupção. Infelizmente, como podemos observar, o Brasil figura como um destaque negativo nesta análise.
É fundamental esclarecer que a percepção de corrupção não representa necessariamente a corrupção de fato, uma vez que ela reflete o sentimento que a população possui em relação à corrupção. Contudo, não seria apropriado descartá-la apenas por essa característica. Utilizando uma analogia corporativa, podemos compará-la ao clima organizacional que embora não seja possível quantificar precisamente quão positivo ou negativo é o ambiente dentro de uma empresa, ele é claramente percebido pelos colaboradores que nela atuam.
Competitividade Global
Trazendo agora a análise para indicadores de competitividade e liberdade econômica, podemos observar que o Brasil, infelizmente, mais uma vez, constitui um destaque negativo, ocupando a colocação 58 de 69 países, posicionando-nos muito mais próximos de países como a Mongólia do que da Suíça ou Suécia.
Este desincentivo à competitividade traz sérias consequências, pois o protecionismo que gera reserva de mercado no Brasil termina deixando os produtos nacionais com baixa demanda global, uma vez que já existiriam produtos melhores e mais baratos sendo ofertados por outros países. Esta doença crônica do Brasil engloba aspectos como infraestrutura deficiente, sistema tributário complexo, burocracia excessiva, baixa qualificação da mão de obra, entre outros fatores. É mais uma das incontáveis âncoras que impedem o nosso crescimento.
Liberdade Econômica
O ranking de liberdade econômica, avaliado pelo Heritage Foundation, demonstra como o Brasil, infelizmente, piorou nos últimos 30 anos, pelo menos do ponto de vista do ranking de liberdade econômica. Saímos da posição 73 para a posição 117, chegando a atingir uma mínima de 153 em 2018. Porém, vale a pena também analisar sob outra perspectiva: há 30 anos, apenas metade dos países, aproximadamente 100, eram cobertos no ranking de liberdade econômica. Por esse motivo, decidimos fazer a análise também com a pontuação de cada um desses países, não apenas com o ranking do Brasil.
Analisando o gráfico, podemos observar alguns países que melhoraram ou pioraram sua pontuação de 1995 até 2025. Aqueles países que estão acima da linha tracejada melhoraram a pontuação, e os que estão abaixo pioraram. Como podemos notar, o Brasil teve uma leve melhora, porém muito distante da que seria necessária para começarmos a gerar uma verdadeira riqueza de longo prazo no país. Também é importante analisar um fato preocupante: estamos muito mais próximos dos países da África, que no gráfico foram representados pelos círculos verdes, do que da própria América Latina, que estão em vermelho. Ou seja, até entre os nossos pares, somos um destaque negativo.
- POR DENTRO DO ECOSSISTEMA ETHEREUM
Lançado em 2015, o Ethereum é uma blockchain pública e descentralizada. Diferente do Bitcoin, que foi criado para atuar essencialmente como moeda digital, o Ethereum nasceu com a proposta de ser uma plataforma programável, onde desenvolvedores podem criar aplicações que operam de forma autônoma e transparente, sem a necessidade de intermediários.
As transações no Ethereum são registradas em blocos interligados, formando a blockchain. Essas operações são validadas por validadores (no modelo atual de proof-of-stake), garantindo a segurança e a integridade da rede. Um diferencial do Ethereum é a capacidade de executar smart contracts — contratos inteligentes, ou seja, programas que rodam automaticamente quando determinadas condições são atendidas.
Esse recurso abriu espaço para o surgimento de novas aplicações financeiras e comerciais, expandindo o uso da blockchain para além das transferências de valores.
Principais aplicações do ecossistema Ethereum:
- Contratos Inteligentes (Smart Contracts): Permitem a criação de contratos digitais autônomos, que executam ordens automaticamente sem a necessidade de intermediários. Exemplos: transações financeiras, compra e venda de ativos, registro de propriedade e seguros.
- DeFi (Finanças Descentralizadas): Uma das maiores inovações recentes, as DeFi são protocolos que oferecem serviços financeiros — como empréstimos, staking e corretoras descentralizadas (DEX) — de forma automatizada, acessível e sem bancos tradicionais. Tudo operando diretamente na rede Ethereum, com liquidez global e sem fronteiras.
- NFTs (Tokens Não Fungíveis): Ativos digitais únicos que representam propriedade de itens digitais ou físicos, como obras de arte, itens colecionáveis, ingressos e imóveis tokenizados. Os NFTs utilizam os padrões ERC-721 ou ERC-1155 da rede Ethereum.
- Tokenização de Ativos (RWA): Cada vez mais explorada por empresas e instituições, a tokenização permite converter ativos físicos e financeiros em tokens digitais negociáveis, oferecendo liquidez e fracionamento de propriedades.
Como combinado na carta anterior, nesta edição vamos nos aprofundar no universo DeFi (Finanças Descentralizadas). Esse ecossistema, que une tecnologia blockchain a serviços financeiros inovadores, está transformando a forma como enxergamos investimentos, empréstimos, pagamentos e a gestão de patrimônio.
O que são as Finanças Descentralizadas?
As Finanças Descentralizadas representam um ecossistema de aplicações financeiras construídas sobre redes blockchain, principalmente Ethereum. Diferentemente dos sistemas financeiros tradicionais, que dependem de intermediários como bancos e corretoras, o DeFi opera através de contratos inteligentes (smart contracts) que executam transações automaticamente, sem necessidade de supervisão humana.
O Ethereum, sendo a plataforma líder para aplicações inovadoras e redes blockchain, oferece um sistema financeiro sempre aberto e imparcial, proporcionando acesso global a serviços financeiros anteriormente restritos a determinadas geografias ou classes sociais.
Principais Segmentos do DeFi:
- Exchanges Descentralizadas (DEXs): Corretoras que permitem a troca de criptomoedas sem intermediários centralizados, oferecendo maior privacidade e controle aos usuários. Exemplos incluem Uniswap, SushiSwap e PancakeSwap.
- Protocolos de Empréstimo e Lending: Plataformas como Aave, Compound e MakerDAO permitem que usuários emprestem e tomem emprestado criptomoedas, geralmente oferecendo taxas de juros mais atrativas que o sistema tradicional.
- Criptomoedas Estáveis (Stablecoins): São moedas digitais projetadas para manter seu valor estável, geralmente atreladas a ativos como o dólar americano ou outras reservas de valor confiáveis. Seu principal objetivo é oferecer estabilidade de preço dentro do mercado cripto, funcionando como uma ponte segura entre o dinheiro tradicional e os ativos digitais mais voláteis.
- Mercados de Previsão (Prediction Markets): São plataformas financeiras onde os participantes podem negociar contratos ou tokens baseados no resultado de eventos futuros. Exemplos incluem Polymarket, Augur (REP) e Gnosis (GNO).
- Seguros Descentralizados: São soluções desenvolvidas no ambiente DeFi que oferecem proteção contra riscos, como falhas em contratos inteligentes, invasões ou perdas de ativos. Toda a operação é automatizada por meio de contratos inteligentes na blockchain.
O cenário atual do mercado DeFi:
O mercado de DeFi tem apresentado crescimento exponencial e projeções extremamente otimistas. Valor Total Bloqueado (TVL) em protocolos DeFi ultrapassou US$111 bilhões em 2025 e espera-se que atinja cerca de US$1.55 trilhão até 2034.
Legenda: Ranking dos 10 principais protocolos DeFi, com base no Valor Total Bloqueado (TVL).
A rede Ethereum lidera o setor, concentrando aproximadamente 55% desse montante, mesmo diante do avanço de blockchains concorrentes como Solana, Binance Smart Chain, Avalanche e Base.
Legenda: Ranking das principais redes utilizadas no ecossistema DeFi.
Principais Estratégias:
- Yield Farming: É uma estratégia onde o investidor movimenta seus criptoativos entre diferentes protocolos DeFi para buscar os melhores rendimentos possíveis.
- Liquidity Mining: É uma forma específica de Yield Farming onde, além dos juros ou taxas, o investidor é recompensado com tokens do próprio protocolo como incentivo para fornecer liquidez.
- Staking: é o processo de bloquear criptoativos em uma blockchain que utiliza o mecanismo de Prova de Participação (Proof of Stake — PoS) ou suas variações, para ajudar na validação de transações e na segurança da rede. Atualmente a rede Ethereum utiliza esse mecanismo.
- Liquid Staking: É uma evolução do staking tradicional. Ele permite que o usuário faça staking dos seus tokens, mas receba, em troca, um token derivado ou representativo do valor em staking, que pode ser usado livremente no ecossistema DeFi.
Principais Tendências:
- Tokenização de Ativos Reais (RWA): A transformação de ativos do mercado tradicional em tokens digitais está ganhando tração, permitindo maior liquidez e acessibilidade a diversos investimentos, esse tema abordamos na carta de Abril.
- Interoperabilidade Cross-Chain: Soluções que permitem a comunicação entre diferentes blockchains, aumentando a eficiência e reduzindo custos.
- Integração com Inteligência Artificial: Plataformas DeFi estão incorporando IA para otimização de estratégias de investimento e gestão de riscos.
- Automação de Gestão de Tesouraria DeFi: Protocolos de asset management e vaults programáveis ganham tração para otimizar rendimentos de tesourarias corporativas e DAOs.
- Adoção Institucional: Grandes instituições financeiras estão começando a integrar soluções DeFi em suas operações.
A crescente adoção de contratos inteligentes e aplicações descentralizadas reforça o potencial dessa tecnologia para remodelar não apenas os mercados financeiros, mas também áreas como governança, seguros, infraestrutura pública e sustentabilidade. Diante desse cenário, acompanhar a evolução do ecossistema Ethereum e de suas aplicações deixou de ser uma pauta restrita aos entusiastas de tecnologia e passou a integrar a agenda estratégica de qualquer investidor ou gestor patrimonial com visão global.
A Zanella Wealth mantém o compromisso com a curadoria de oportunidades, análise de riscos e construção de estratégias para proteger o patrimônio de nossos clientes, diversificado e posicionado nas melhores assimetrias do mercado internacional. Na próxima carta, vamos aprofundar no universo dos NFTs (Tokens Não Fungíveis) e suas funcionalidades no mundo atual.
Carta elaborada por Renan Zanella, CFA, Lucas Viero De Conti, CNPI, Lucas Pessoa, CEA e Thomaz Santos.
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