Carta Mensal – Relatório de Alocação Maio 2025

A ORIGEM DA ÂNSIA POR MAIS IMPOSTOS: A PERDA DO BOOM DEMOGRÁFICO DO BRASIL 

“A verdade é que o Brasil nunca perde a oportunidade de perder uma oportunidade”. Esta frase, popularizada pelo ex-presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, sintetiza bem a lógica de inércia que impera em diversas decisões políticas e econômicas no país.

Entre tantas oportunidades desperdiçadas, uma delas é especialmente grave: o boom populacional. Trata-se de um momento histórico raro em que o país poderia ter enriquecido de forma sustentável, aproveitando o rápido crescimento de sua população economicamente ativa.

Esse período, segundo os dados do site Gapminder, começou nos anos 1950, quando o Brasil tinha aproximadamente 54 milhões de habitantes, e se estendeu até 2021, quando ultrapassamos os 214 milhões. A lógica seria simples: com quatro vezes mais pessoas trabalhando, deveríamos estar produzindo e gerando riqueza em escala proporcional. Mas isso claramente não aconteceu por falta de planejamento estratégico, liberdade econômica e visão de longo prazo de nossos governantes.

O Custo do Desperdício: Envelhecimento Precoce

Esse fracasso tem efeitos profundos e duradouros. Envelhecemos antes de enriquecer, e agora o custo disso recai sobre o presente e o futuro. A pirâmide etária está se invertendo, com menos nascimentos e mais pessoas vivendo por mais tempo. A expectativa de vida no Brasil passou de 31 anos em 1931 para 76 anos em 2019 e pode chegar a 89 anos em 2100. O que deveria ser motivo de celebração se torna motivo de aflição, considerando o peso fiscal que isso representa.

Para compreender a dimensão desse problema, basta observar a evolução demográfica desde 1950. Naquele ano, a população entre 20 e 59 anos — faixa aproximada da população economicamente ativa — representava 43% do total, enquanto os idosos com mais de 60 anos eram apenas 4%. O ponto de maior participação da população ativa foi atingido em 2022, com 57,8%. A partir daí, a tendência é de queda até atingir novamente 43% em 2100. Já os idosos seguirão crescendo: de 4% em 1950 para cerca de 40% em 2100.

Traduzindo em proporções mais claras: em 1950 o Brasil tinha quase 11 trabalhadores por idoso. Em 2022, essa razão caiu para 4 trabalhadores por idoso. E, segundo as projeções, em 2100 será praticamente de 1 para 1. Definitivamente, não há como essa conta fechar.

A Crise Previdenciária: Sintoma de um Problema Maior

Diante desse cenário demográfico adverso, a estrutura atual da previdência pública brasileira, somada ao pagamento de juros da dívida, compõe a maior parte das despesas do Estado. O problema não está apenas na arrecadação, mas no gasto excessivo e na lógica insustentável do sistema.

Três indicadores confirmam essa tendência preocupante:

Evolução das alíquotas (1994-2025): Desde 1994, a alíquota mínima do INSS para trabalhadores CLT se manteve relativamente estável, entre 7,5% e 8%. Já a alíquota máxima saltou de 9,77% para 14% em 2025.

Diminuição do teto de contribuição: O teto para o pagamento do INSS vem encolhendo sistematicamente. Em 1994, a alíquota máxima incidia sobre quem ganhava 4,5 salários mínimos. O pico ocorreu em 2004, com 5 salários mínimos. Hoje, a alíquota de 14% já incide sobre quem recebe 2,7 salários mínimos. Desde 2020, até quem ganha 1 salário mínimo já contribui com a alíquota mínima.

Estagnação dos benefícios reais: O valor médio recebido por aposentado cresceu ao longo do tempo, chegando hoje a R$ 1.863. No entanto, isso representa apenas 1,32 vezes o salário mínimo — valor que se manteve estável entre 1,2 e 1,5 vezes desde 1996.

Esses números revelam um paradoxo cruel: contribuições crescentes gerando benefícios proporcionalmente menores. Mesmo com essa elevação da cobrança, os benefícios não melhoraram, e isso tende a pressionar ainda mais o Estado por arrecadação, levando a mais impostos e mais inflação.

Outro dado relevante, mas frequentemente ignorado, é a evolução da idade média de aposentadoria. De 2000 a 2024, essa média subiu de aproximadamente 52,5 anos para 61,8 anos. Se projetarmos essa tendência com base nos últimos 25 anos, podemos estimar que em 2050 a idade média para se aposentar será próxima de 72 anos. Isso não significa que será a idade efetiva de aposentadoria, mas serve como referência para os cálculos do próprio governo. O problema é que, mesmo com essa elevação, o INSS continua operando no vermelho ano após ano, porque a estrutura criada depende continuamente da entrada de novos contribuintes para pagar os benefícios dos atuais — um esquema Ponzi institucionalizado.

Lições Internacionais: O Exemplo Dinamarquês

O exemplo internacional mais recente vem da Dinamarca, que não está sozinha nessa batalha demográfica. Em maio de 2025, o Parlamento dinamarquês aprovou uma lei que eleva gradualmente a idade mínima de aposentadoria para 70 anos até 2040, tornando-se a mais alta da Europa. A decisão busca justamente reduzir o rombo crescente da previdência pública em meio ao envelhecimento acelerado da população.

O caso dinamarquês não é isolado, mas representa uma tendência global de países que enfrentam problemas similares ao nosso, porém com maior capacidade política de implementar reformas estruturais duras. Trata-se de um exemplo concreto de como medidas impopulares tornam-se inevitáveis quando os números simplesmente não fecham.

O Preço da Oportunidade Perdida

É por esse motivo que o Brasil desperdiçou a única janela demográfica para enriquecer de maneira exponencial. Esse erro histórico custará caro às futuras gerações, que herdarão o peso de mais impostos, mais inflação e mais dívida pública.

A tragédia é que dificilmente o país optará por aumentar liberdades econômicas — o caminho mais eficaz para gerar riqueza — e continuará preferindo o atalho de sempre: cobrar a conta dos próprios cidadãos, através de mais impostos e inflação.

O Brasil perdeu uma janela demográfica irrepetível. Agora, resta apenas a difícil tarefa de administrar as consequências dessa oportunidade desperdiçada, enquanto uma nova geração herda um país demograficamente envelhecido e fiscalmente comprometido. A frase de Roberto Campos Neto nunca foi tão atual — e tão amarga.

  • BOLSA BRASIL

O início do ano marcou a retomada do sentimento de otimismo dos principais índices acionários no Brasil, afastando o mau humor de 2024 e, inclusive, fechando a porta para a um prêmio acima da média sobre os juros, de quase um desvio padrão, fato observado em janeiro e comentado por aqui. O estudo abaixo do Itaú ainda indica que estamos com alguns múltiplos em patamares atrativos, porém com um prêmio mais restrito, ao mensurar por meio do earnings yield gap, utilizando da referência do percentual de lucro sobre o preço das ações, o oposto do múltiplo P/L, e retraindo pela taxa de juros real do país, por meio das NTN-Bs, os títulos IPCA+ aos 12 meses sequentes.

É importante frisar que ainda entendemos o cenário como propício para a continuidade da valorização da bolsa local, porém de maneira não tão óbvia quanto em meses atrás, tendo em vista que demanda da continuidade do fechamento de nossa curva de juros para um prêmio razoavelmente adequado. Ou, ainda, de resultados e revisões de lucros reportados além das estimativas e projeções do mercado, o que aparentemente não é o caso na sequência do ano. Acima de tudo, destacamos o fato de que seu asset allocation deve ser respeitado, reforçando a racionalidade da alocação nos percentuais estimados e definidos previamente. Lembre-se que é muito fácil de se considerar um investidor arrojado em um ciclo de alta da bolsa. Respeite seu perfil e o seu planejamento.

  • IGNORANDO RUÍDOS 

Ao aproximarmos da virada do semestre do ano corrente, observamos muitos ruídos no mercado internacional decorrentes das tensões políticas e tarifárias envolvendo as condutas de Donald Trump e a imposição de tarifas recíprocas aos demais países, alegando desequilíbrio tarifário imputado aos Estados Unidos. Fato é que, passados 5 meses, o mercado aparentemente deixa de lado esses imbróglios, apesar da importante valorização de mercados emergentes e desenvolvidos em uma rotação evidente, e toda a volatilidade e desvalorização do S&P500 provocada principalmente por tais questões, agora fica ofuscada por mais um retorno positivo no acumulado do ano do principal índice acionário do mundo.

O texto weathering the storm, da Avantis (você confere por meio desse link https://www.avantisinvestors.com/avantis-insights/trade-policy-inflation-fears-weakening-dollar/, ainda no período de correção do S&P500, buscou aprofundar o tempo de recuperação no mercado acionário americano diante de quedas em diferentes percentuais, conforme conteúdo da imagem abaixo:

De maneira geral, o mercado acionário americano tende a se recuperar de forma rápida das quedas: a média do retorno das ações do mercado americano, depois de 100 dias de uma queda de 2.5% costuma ser de 5.83% de valorização. Isso fica ainda mais evidente quando observamos o comportamento das small caps de valor – em síntese, empresas de menor capitalização de mercado às demais, com múltiplos atrativos para alocação – que apreciam em média 9.69%, 100 dias após quedas de 2.5%. Demais níveis de quedas, mais robustos, demandam de maior tempo para recuperação, porém também são observados percentuais importantes após 100 dias em cada nível.

Inspirados no conteúdo acima, buscamos trazer o mesmo estudo ao mercado local, procurando observar o comportamento do Ibovespa depois de 100 dias em diferentes níveis de queda, a saber:

Da base extraída com dados desde o dia 01 de julho de 1994, observamos percentuais mais modestos de recuperação de nosso principal índice local para faixas menores, indicando a condição de uma recuperação mais lenta depois de um drawdown. Também, é importante frisar que o efeito não linear dos retornos compostos também exige percentuais de ganhos maiores para recuperar de uma queda. 

Apesar de ainda distanciar de uma recuperação plena, após faixas de quedas mais expressivas, também é maior a tendência de um retorno positivo do índice, ao encontro do conteúdo do gráfico acima. 

  • POR DENTRO DO ECOSSISTEMA ETHEREUM

Lançado em 2015, o Ethereum é uma blockchain pública e descentralizada. Diferente do Bitcoin, que foi criado para atuar essencialmente como moeda digital, o Ethereum nasceu com a proposta de ser uma plataforma programável, onde desenvolvedores podem criar aplicações que operam de forma autônoma e transparente, sem a necessidade de intermediários.

As transações no Ethereum são registradas em blocos interligados, formando a blockchain. Essas operações são validadas por validadores (no modelo atual de proof-of-stake), garantindo a segurança e a integridade da rede. Um diferencial do Ethereum é a capacidade de executar smart contracts — contratos inteligentes, ou seja, programas que rodam automaticamente quando determinadas condições são atendidas.

Esse recurso abriu espaço para o surgimento de novas aplicações financeiras e comerciais, expandindo o uso da blockchain para além das transferências de valores.

Principais aplicações do ecossistema Ethereum:

  • Contratos Inteligentes (Smart Contracts): Permitem a criação de contratos digitais autônomos, que executam ordens automaticamente sem a necessidade de intermediários. Exemplos: transações financeiras, compra e venda de ativos, registro de propriedade e seguros.
  • DeFi (Finanças Descentralizadas): Uma das maiores inovações recentes, as DeFi são protocolos que oferecem serviços financeiros — como empréstimos, staking e corretoras descentralizadas (DEX) — de forma automatizada, acessível e sem bancos tradicionais. Tudo operando diretamente na rede Ethereum, com liquidez global e sem fronteiras.
  • NFTs (Tokens Não Fungíveis): Ativos digitais únicos que representam propriedade de itens digitais ou físicos, como obras de arte, itens colecionáveis, ingressos e imóveis tokenizados. Os NFTs utilizam os padrões ERC-721 ou ERC-1155 da rede Ethereum.
  • Tokenização de Ativos (RWA): Cada vez mais explorada por empresas e instituições, a tokenização permite converter ativos físicos e financeiros em tokens digitais negociáveis, oferecendo liquidez e fracionamento de propriedades.

Como combinamos na carta anterior, nesta edição vamos aprofundar o tema Contratos Inteligentes (Smart Contracts) um dos conceitos mais inovadores e relevantes para o mercado financeiro digital. Na prática, programas de computador que executam automaticamente regras e acordos pré-definidos entre as partes, sem a necessidade de intermediários.

A Ethereum foi a pioneira na criação e implementação de contratos inteligentes no mundo. Esses contratos são desenvolvidos utilizando a linguagem Solidity e ficam armazenados na blockchain, tornando-se imutáveis e auditáveis publicamente. Assim que as condições previamente estabelecidas são atendidas, o contrato se autoexecuta, eliminando riscos de inadimplência, fraudes ou alterações unilaterais.

Como funcionam os Contratos Inteligentes na prática:

Para entender de forma prática, imagine um contrato inteligente criado para um crowdfunding (financiamento coletivo). Assim que o valor total arrecadado atingir a meta estipulada dentro do prazo acordado, os recursos são automaticamente liberados ao projeto. Caso contrário, os valores são devolvidos aos investidores — sem qualquer intervenção humana ou instituição financeira.

Essa lógica se aplica a uma infinidade de casos: desde operações financeiras e garantias bancárias até registros de propriedade e negociações automatizadas de ativos digitais.

Contratos Inteligentes estão revolucionando o mercado:

Os contratos inteligentes vêm revolucionando a forma como transações e acordos são realizados. Na prática, substituem a confiança institucional pela confiança programada, automatizando a execução de regras previamente definidas. Ao eliminar intermediários, reduzem custos, aceleram processos e aumentam significativamente a transparência nas operações.

E o mais importante: essa tecnologia já deixou de ser conceito e está sendo aplicada em diversos setores da economia real. A seguir, destacamos alguns dos principais casos de uso que já estão em funcionamento ao redor do mundo:

  • Setor Público e Governança Digital: No Brasil, o governo tem investido na tecnologia blockchain para aprimorar a transparência e a eficiência dos serviços públicos. Iniciativas como o projeto bCPF, desenvolvido pelo Serpro, visam criar uma identidade digital única para os cidadãos, utilizando contratos inteligentes para validar e gerenciar dados pessoais de forma segura e descentralizada.
  • Setor de Seguros e Automação de Sinistros: Nos EUA, empresas como Lemonade e Etherisc estão revolucionando o setor de seguros com o uso de contratos inteligentes para automatizar processos de sinistros. Por exemplo, seguros paramétricos para agricultores podem ser acionados automaticamente com base em dados climáticos, agilizando pagamentos e reduzindo fraudes.
  • Emissão de Títulos Financeiros: O banco francês Société Générale emitiu títulos financeiros utilizando contratos inteligentes na blockchain Ethereum. Essa iniciativa permitiu a automação de processos de emissão e liquidação de títulos, aumentando a eficiência e reduzindo custos operacionais.
  • Tokenização de Ativos Imobiliários: Na Alemanha, a plataforma Fundament Group utiliza contratos inteligentes para tokenizar ativos imobiliários. Isso permite que investidores adquiram frações de propriedades, democratizando o acesso ao mercado imobiliário e aumentando a liquidez desses ativos.
  • Rastreabilidade na Cadeia de Suprimentos Agrícola: A empresa australiana Datahash implementou contratos inteligentes para rastrear a cadeia de suprimentos de produtos agrícolas, como vinhos. Utilizando a tecnologia da Hedera Hashgraph, é possível garantir a autenticidade e a origem dos produtos, combatendo fraudes e melhorando a transparência para os consumidores.
  • Identidade Digital e Serviços Governamentais: A Estônia é pioneira na integração de contratos inteligentes em serviços governamentais. O país implementou um sistema de identidade digital que permite aos cidadãos acessar diversos serviços públicos de forma segura e eficiente, utilizando contratos inteligentes para validar transações e autenticar usuários.
  • Registro de Propriedades com Blockchain: Em Dubai, os contratos inteligentes são utilizados para registrar propriedades imobiliárias na blockchain, eliminando a necessidade de documentação física e reduzindo significativamente o tempo e os custos associados às transações imobiliárias.
  • Finanças Descentralizadas (DeFi): O setor financeiro descentralizado, ou DeFi, lidera a adoção de contratos inteligentes no mundo. Plataformas como Aave, Lido, Uniswap, Pancakeswap e Osmosis permitem a realização de empréstimos, negociações e aplicações financeiras de maneira automatizada e sem intermediários. Esses serviços democratizam o acesso a soluções financeiras e ampliam oportunidades para públicos que, muitas vezes, ficam à margem dos sistemas tradicionais esse será o tema da nossa próxima carta mensal.

A crescente adoção de contratos inteligentes ao redor do mundo evidencia o enorme potencial dessa tecnologia para reestruturar mercados e processos, impactando desde serviços públicos e governança digital até finanças descentralizadas, seguros e sustentabilidade. Para investidores e profissionais do mercado financeiro, compreender essas inovações e acompanhar sua evolução deixou de ser uma curiosidade tecnológica e passou a ser uma necessidade estratégica.

Seguiremos atentos a essas transformações e, nas próximas cartas mensais, vamos aprofundar nas outras aplicações do ecossistema Ethereum. Nosso compromisso permanece em entregar análises criteriosas e estratégias sólidas para proteger, diversificar e potencializar o patrimônio dos nossos clientes, conectando suas carteiras às melhores oportunidades em escala global.

Carta elaborada por Renan Zanella, CFA, Lucas Viero De Conti, CNPI, Lucas Pessoa, CEA e Thomaz Santos.

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Renan Zanella, CFA
Renan Zanella, CFA
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